segunda-feira, 24 de maio de 2010

entre-ando

O cachorro

O cachorro que olho fareja as ruas
com a mesma ansiedade que minhas mãos

bem sabe esse cachorro
que todos os dias fareja as mesmas ruas
que as ruas nunca são as mesmas

mas esse cachorro
ultrapassa meus olhares correlatos ao pôr


..................................................................................do sol


Rafael Lemos, 13-05-'10(?).


an other thing:

floriferar é trazer
a fera da flor à flor,
às feridas de cada pétala.

terça-feira, 2 de março de 2010

Instante

"Oito patas tem o bicho homem após amar"
V.D.
Morre aos poucos uma paixão.
Morre, assim como morrem neste instante
as rubras rosas e a rosa branca solitária
que eu dei a você
e você pôs em um jarro:
acolheu-as em casa para que não morressem
secas à soleira da porta, mas
morrem.
Morrem como morro eu,
como morre você e como
morrem todos os já nascidos
e morrerão os por nascer
e tantas outras
rosas,
paixões não colhidas à porta
nem trazidas para dentro do seio,
acalentadas: essas
morrem.
Morre aos poucos uma paixão,
mas sem deixar uma lágrima sequer cair,
porque não é uma paixão que se apieda de si
nem chora da própria desgraça.
É uma paixão brava, valente,
que se expõe, que se propõe a todos os riscos,
como o risco de ser negada
ou partida em dois e n"ao ter quem as una, essas duas partes,
antes que uma sozinha
se resolva pela partida,
sabendo dessa sua partida
a morte sua,
restando apenas à outra parte,
deixada para trás,
morrer por si só.
A parte que parte se esquece que
resolver-se por partir é resolver-se por solver
essa paixão construída por ambas as partes,
deixá-la apenas à espera da pena
de morte certa.
Morre aos poucos uma paixão
e não adiantam lamentos
ante os desencontros
dessa vida.
Morre aos poucos uma paixão
e o custo de salvá-la
é o custo da própria vida:
é reunir tudo quanto for dor
e untar cada ferida,
fazer nascer dessas chagas
novamente a paixão
e vivê-la não com uma vida
mas com o vigor das duas vidas as quais essa paixão
goza de direito.
Então assim não será mais duas,
mas uma única singular paixão
feita e sustentada
por um só bicho de oito patas, quatro delas mãos
e que durará toda a vida da paixão
até que morra antes
as metades das quais o bicho é feito
ou o ardor da paixão,
mas é necessário que morra algo
para que não termine sem razão
como morrem secas
as pétalas
espalhadas no chão.
Rafael Lemos, 22-02-'10.

sábado, 28 de novembro de 2009

Amanhecer O que pétala

O amanhecer desponta
..........................................na ponta
da pétala da flor
..........................................quer queira, quer não
qualquer coisa que não
..........................................se despe, não
se des-pétala, não
..........................................diz como pétala:
não amanhece
..........................................nem desperta.


Rafael Lemos, 28-11-'09.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A poesia é arte visual.

A poesia é arte visual

:


Este blog


não concebe as possibilidades que isso propõe.


segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Palestras do Ferreira Gullar

Entao, nessas andanças a gente acaba esbarrando nuns caras desses e, com sorte, com um gravador. Aqui vão duas palestras do Ferreira Gullar, uma na Biblioteca Nacional, que é interessante, mas ele fala mais dos empregos dele, de diagramação de jornal, só no final é que, inevitavelmente ele fala sobre poesia e responde umasperguntas. A outra é na Bienal desse ano, no Café literário, com Eucanaã Ferraz, professor da Faculdade de Letras da UFRJ, e Claudia Roquette-Pinto, poeta. O áudio dessa última é um pouco melhor que o da primeira.

Bom, sem mais, baixem e ouçam:

Gullar na Biblioteca Nacional:
http://www.4shared.com/file/140395909/8d83d96f/Gullar_na_Biblioteca_Nacional.html

Gullar no Café Literário na Bienal do Livro:
http://www.4shared.com/file/140398015/60954757/Gullarna_cafe_literario_Bienal_do_livro_09.html

sábado, 19 de setembro de 2009

Observações

- Líquido e mudo, estou em contato com a não-presença da matéria: é com isso que crio todas as coisas

- No que afundo à lama, somem meus pés, mas minha palavra flutua, de modo que não necessito de pés e aindassim mantenho-me em movimento.

- Movimento é onde os elementos perfazem-se, onde as coisas deixam de ser perfeitas: habitam e permanacem qualquer âmbito da imensidão do homem sem reduzirem-se a uma significância.

- Da minha boca saem pássaros. Falo com propriedade a respeito deles pois habitam dentro de mim. Saem, mas permanecem dentro.

- Tudo que se faz com afetividade é concreto.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Revisitando : deixar-se revisitar (sur ma parole)

O Livro Sobre Nada
  • Com pedaços de mim eu monto um ser atônito.
  • Tudo que não invento é falso.
  • Há muitas maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é verdadeira.
  • Não pode haver ausência de boca nas palavras: nenhuma fique desamparada do ser que a revelou.
  • É mais fácil fazer da tolice um regalo do que da sensatez.
  • Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada; mas se não desejo contar nada, faço poesia.
  • Melhor jeito que achei para me conhecer foi fazendo o contrário.
  • A inércia é o meu ato principal.
  • Há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas.
  • O artista é um erro da natureza. Beethoven foi um erro perfeito.
  • A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos.
  • Quero a palavra que sirva na boca dos passarinhos.
  • Por pudor sou impuro.
  • Não preciso do fim para chegar.
  • De tudo haveria de ficar para nós um sentimento longínquo de coisa esquecida na terra — Como um lápis numa península.
  • Do lugar onde estou já fui embora.

Manoel de Barros

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Estilística invencível

Um dia

controlar meus passos

hei ?

.

Donde estou não quero estar.
vontade
o motor impulsiona
e no instante seguinte
já não somos já não estamos já
não sabemos
e ainda assim
nenhum de nós ousa romper
com as entranhas da parole e
entrar no âmago
de suas infinitas possibilidades
, mas apenas
permanENTE
mente
quanto possível;
se:quer mentar
o frágil fio de mistério:
quer um nome, uma pegada, uma sensação de memória
que nos une
ao movimento anterior,
que nos leva
(repetidamente) as
entranhas,
às
estranhas